Perfil | Excertos de traduções | Bibliografia
Mario de Miranda Quintana nasceu no dia 30 de julho de 1906, na cidade de Alegrete no Rio Grande do Sul. O poeta inicia na infância o aprendizado da língua francesa, idioma muito usado em sua casa. Aos 13 anos, em 1919, vai estudar em regime de internato no Colégio Militar de Porto Alegre. É quando publica seus primeiros trabalhos na revista Hyloea, da Sociedade Cívica e Literária dos Alunos do Colégio Militar. Cinco anos depois vai trabalhar como caixeiro (atendente) na Livraria do Globo.
Aos 17 anos publica um soneto em jornal de Alegrete, com o pseudônimo JB. Em 1925 retorna a Alegrete e passa a trabalhar na farmácia de propriedade de seu pai. Recebe o prêmio do concurso de contos do jornal Diário de Notícias de Porto Alegre com “A Sétima Passagem” e publica de um de seus poemas na revista carioca Para Todos, de Alvaro Moreyra. Em 1929 Mario está com 23 anos quando vai para a redação do jornal O Estado do Rio Grande traduzir telegramas e redigir uma seção chamada “O Jornal dos Jornais”.
Em 1930 a Revista do Globo e o Correio do Povo publicam seus versos e quatro anos depois, a Editora Globo lança a primeira tradução de Quintana, seis anos antes de seu primeiro livro editado. Trata-se de uma obra de Giovanni Papini, intitulada Palavras e Sangue. A partir daí, segue-se uma série de obras francesas traduzidas para a Editora Globo. O poeta é responsável pelas primeiras traduções no Brasil de obras de autores canônicos.
Dois anos depois, transfere-se para a Livraria do Globo, onde vai trabalhar com Érico Veríssimo, também fluente em língua francesa. É por esta época que seus textos publicados na revista Ibirapuitan chegam ao conhecimento de Monteiro Lobato, que pede ao poeta gaúcho uma nova obra. Quintana escreve, então, Espelho Mágico, que só é publicado em 1951, com prefácio de Lobato.
Quintana receberá numerosos prêmios e distinções até o final de sua vida, notadamente, em 1966 o Prêmio Fernando Chinaglia de melhor livro do ano por sua Antologia Poética, o título de Cidadão Honorário de Porto Alegre, a condecoração do Governo do Rio Grande do Sul (medalha Negrinho do Pastoreio), o Prêmio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto da obra e em 1982 e títulos de Doutor Honoris Causa, concedidos pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a Unicamp e a Universidade Federal do Rio de Janeiro. Uma das mais importantes homenagens ocorreu em 1983, quando o Hotel Majestic, onde o poeta morou de 1968 a 1980, passou a chamar-se Casa de Cultura Mario Quintana. As homenagens ao poeta não cessaram até e depois de sua morte, aos 88 anos, em 5 de maio de 1994.
O escritor foi um tradutor profícuo: aproximadamente 30 obras. No entanto, o número exato é controverso, pois usava pseudônimos e nem mesmo ele se lembrava de quantos livros traduzira. Em 1936, começa a traduzir oficialmente para a Editora Globo: Maupassant, Proust, Charles Morgan, Voltaire, Virgínia Woolf, entre outros. Traduzia principalmente autores franceses e ingleses. Observe-se que sua atividade de tradutor sucedeu principalmente ao longo da década de trinta, continuando a traduzir paralelamente a seu trabalho como poeta nos anos quarenta e cinquenta. Para ele, traduzir era um meio de ganhar a vida, mas também constituía o prazer e o esforço por um trabalho bem feito, o que certamente não correspondia ao perfil do tradutor burocrático, como ele mesmo assegura em depoimento a Araken Távora:
Mas, como eu ia dizendo, traduzia porque gostava daqueles livros. E quanto mais difícil o livro, mais eu gostava. Por isso, entre todos os autores que traduzi, o que me deu mais satisfação foi Virgínia Woolf. Mesmo porque o páreo era duro: antes de mim, quem havia traduzido a Virgínia no Brasil era nada menos do que Cecília Meireles. Eu tinha que ser digno da minha amizade e admiração pela Cecília.[...]
Antes de tudo, Proust foi para mim um trabalho e um prazer ao mesmo tempo, porque olha que traduzir Proust... Ele tem períodos enormes que dão volta na página e eu devia traduzir preservando a mesma clareza do original. Tanto que comentei com o Érico Veríssimo, que dirigia o setor de traduções da Editora Globo: “Estou gostando tanto de traduzir o Proust que, se eu tivesse dinheiro, eu é que pagava para vocês”. [...]
Quando houve o primeiro aumento geral, fui o único a não ser aumentado. Naturalmente, tomei satisfações. A resposta que me deram foi que eu levava muito tempo na tradução. “Você,afinal, levou quatro meses para traduzir um volume”. Ora, eles não compreendiam que eu tinha que demorar tanto tempo quanto Proust levara para escrever o original, para fazer uma tradução digna. Queriam que eu traduzisse com a mesma velocidade com que traduzia romances sem civilização nenhuma, ditados para uma estenógrafa em uma semana. Por causa disso, abandonei minhas funções de tradutor na Globo e fui trabalhar no Correio do Povo.
Casa de Cultura Mário Quintana. http://www.estado.rs.gov.br/marioquintana/
Faveri, Cláudia Borges de ; Castelli, Eleonora. Em busca do tradutor: Proust e Mérimée por Mário Quintana. UFSC. http://www.periodicos.ufsc.br/index.php/traducao/article/viewFile/6588/6066
Verbete publicado em 24 de March de 2010 por:
Myllena Lacerda
Marie-Hélène Catherine Torres
Gilles Jean Abes
Modificado em 28 de July de 2020
Excerto de À sombra das raparigas em flor, de Marcel Proust. Tradução de Mário Quintana.
Coup de barre et changement de direction dans les caractères. – Le marquis de Norpois. – Bergotte. – Comment je cesse momentanément de voir Gilberte ; première et légère esquisse du chagrin que cause une séparation et des progrès irréguliers de l’oubli. |
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Ma mère, quand il fut question d’avoir pour la première fois M. De Norpois à dîner, ayant exprimé le regret que le professeur Cottard fût en voyage et qu’elle-même eût entièrement cessé de fréquenter Swann, car l’un et l’autre eussent sans doute intéressé l’ancien Ambassadeur, mon père répondit qu’un convive éminent, un savant illustre, comme Cottard, ne pouvait jamais mal faire dans un dîner, mais que Swann, avec son ostentation, avec sa manière de crier sur les toits ses moindres relations, était un vulgaire esbroufeur que le marquis de Nortois eût sans doute trouvé, selon son expression, « puant ». Or cette réponse de mon père demande quelques mots d’explication, certaines personnes se souvenant peut-être d’un Cottard bien médiocre et d’un Swann poussant jusqu’à la plus extrême délicatesse, en matière mondaine, la modestie et la discrétion. Mais pour ce qui regarde celui-ci, il était arrivé qu’au « fils Swann » et aussi au Swann du Jockey, l’ancien ami de mes parents avait ajouté une personnalité nouvelle (et qui ne devait pas être la dernière), celle de mari d’Odette. Adaptant aux humbles ambitions de cette femme l’instinct, le désir, l’industrie, qu’il avait toujours eus, il s’était ingénié à se bâtir, fort au-dessous de l’ancienne, une position nouvelle et approppriée à la compagne qui l’occuperait avec lui. Or il s’y montrait un autre homme. Puisque (tout en continuant à fréquenter seul ses amis personnels, à qui il ne voulait pas imposer Odette quand ils ne lui demandaient pas spontanément à la connaître) c’était une seconde vie qu’il commençait, en commun avec sa femme, au milieu d’êtres nouveaux, on eût encore compris que pour mesurer le rang de ceux-ci, et par conséquent le plaisir d’amour-propre qu’il pouvait éprouver à les recevoir, il se fût servi comme point de comparaison non pas des gens les plus brillants qui formaient sa société avant son mariage, mais des relations antérieures d’Odette. |
Quando pela primeira vez se tratou de convidar o Sr. De Norpois para jantar em nossa casa, como lamentasse minha mãe que o Professor Cottard estivesse em viagem e que ela própria houvesse deixado completamente de freqüentar Swann, pois tanto um como outro certamente interessariam ao ex-Embaixador, respondeu-lhe meu pai que um conviva eminente, um sábio ilustre como Cottard nunca faria má figura à mesa, mas que Swann, com sua ostentação, com aquele jeito de proclamar aos quatro ventos as mínimas relações, não passava de um vulgar parlapapão que o Marquês de Norpois sem dúvida acharia, segundo sua expressão, “nauseabundo”. Essa resposta de meu pai requer algumas palavras de explicação, pois certas pessoas talvez se lembrem de um Cottard bastante medíocre e de um Swann que, em matéria mundana, levava a modéstia e discrição à mais extrema delizadeza. Mas havia acontecido que o “filho de Swann”, e também ao Swann do Jockey, o outrora amigo de meus pais acrescentara uma personalidade nova (e que não devia ser a última): a de marido de Odette. Adaptando às humildes ambições dessa mulher o instinto, a vontade, a indústria que sempre tivera, empenhara-se em construir, muito abaixo da antiga, uma posição nova e adequada à companheira que com ele a partilharia. Ora, nisto, Swann se mostrava outro homem. Pois (embora continuando a freqüentar sozinho seus amigos pessoais, a quem não queria impor Odette quando não lhe solicitavam espontaneamente que a apresentasse), como era uma segunda vida que ele começava, juntamente com a mulher, em meio de criaturas novas, ainda se compreenderia que, para avaliar a posição destas últimas, e por conseguinte o prazer de amor-próprio que poderia experimentar em recebê-las, Swann se servisse, como ponto de comparação, não das pessoas mais brilhantes que formavam sua sociedade antes de seu casamento, e sim das anteriores relações de Odette. |
Proust, Marcel. À l’ombre des jeunes filles en fleur. Paris: Gallimard, 1979. |
Proust, Marcel. À sombra das raparigas em flor. [Por: Mário Quintana]. São Paulo: Abril Cultural, 1984. |
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Água. Os últimos textos de Mario Quintana. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 2001.
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